Os desafios da política de incentivos fiscais
A Lei nº 12.715, de 17 de setembro, resultado da conversão da Medida Provisória (MP) nº 563, entre outros pontos, criou o Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon) e o Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (Pronas/PCD). Com isso, pessoas físicas e jurídicas podem deduzir do Imposto de Renda doações e patrocínios a instituições dedicadas ao tratamento de câncer e reabilitação de pessoas com deficiência.
A criação dos programas, por si só, pode ser considerada um grande avanço na implantação de incentivos fiscais à saúde, mas uma importante alteração proposta pelas entidades sem fins lucrativos (que conduzem grande parte dos atendimentos dessa natureza) e aprovada na Câmara possibilita que a medida seja mais atrativa para o empresariado. É que, a princípio, para pessoas jurídicas a dedução era de até 50% do valor doado e até 40% dos patrocínios. Agora, o percentual passa a ser de 100% para doações e para patrocínios – até o limite de 1% do valor do Imposto de Renda devido, conforme recente ajuste da MP nº 582, de 21 de setembro.
Essa mudança é fundamental para alcançar o benefício social pretendido pela lei, já que há uma série de incentivos que permitem dedução integral. E, em se tratando de uma área tão importante como a saúde, é mais do que necessário que o percentual previsto para dedução do valor aplicado mantenha equidade com as demais leis de incentivo fiscal para diferentes setores, como a Lei Rouanet (incentivo à cultura). Aliás, o que inicialmente parece apenas um pequeno ajuste, em uma análise mais detalhada pode relembrar a necessidade de pensar em uma política de incentivo fiscal mais coesa, articulada e, até mesmo, mais eficiente.
A baixa adesão do empresariado às leis de incentivo fiscal surpreende
Não é de hoje que a baixa adesão do empresariado às leis de incentivo fiscal surpreende. Exemplo disso ocorre com a chamada Lei do Bem – Lei nº 11.196. Editada em 2005, tem como objetivo criar um mecanismo de consolidação de incentivos fiscais para fomentar a pesquisa e o desenvolvimento em inovação tecnológica realizada por pessoas jurídicas tributadas pelo regime do lucro real.
A lei permite duas formas de investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D). A primeira, diretamente feita pela pessoa jurídica com a possibilidade de alcançar o benefício fiscal de 200% de dedução do valor investido do seu lucro líquido apurado. A segunda possibilidade consiste na realização de uma parceria entre a pessoa jurídica e uma instituição de ciência e tecnologia (ICT), que efetivamente executará o projeto, cujo benefício fiscal será de 50% a 250% do valor investido, mas inversamente proporcional ao direito de propriedade registrado.
Contudo, desde a sua vigência, apenas 2072 empresas do país tiveram projetos aprovados e puderam, efetivamente, se beneficiar dos incentivos. Isso porque a legislação ainda é confusa e burocrática, diferindo conforme a aplicação dos recursos, em cálculos e deduções e forma de adesão ao incentivo. Obviamente, a aplicação dos vários incentivos fiscais possui peso diferenciado no resultado das empresas que apuram seus resultados pelo lucro real, mas do ponto de vista prático a lei ainda é bastante complexa.
Por outro lado, não há como negar também que existe grande desconhecimento por parte das empresas. E, dentre as empresas que conhecem, poucas possuem organização e efetivo intercâmbio entre seus setores para uma aplicação positiva da lei. Nesse ponto, é fundamental que o empresariado busque, além de conhecimento, agentes que possam auxiliá-lo a estabelecer a melhor alternativa. De nada adianta os diversos incentivos, se eles não puderem ser aproveitados com efeitos positivos tanto para as empresas como para a sociedade, que é o que se espera das leis de incentivos fiscal.
Identificação com a causa certamente há, mas falta também organização e disposição do Estado em ampliar a política de benefícios fiscais para as empresas tributadas pelo regime do lucro presumido, já que elas representam o maior número de empresas do País (faturamento anual de até R$ 48 milhões).
Da mesma forma, da parte do governo é essencial estudar e aperfeiçoar a legislação vigente, assim como estabelecer mecanismos mais eficientes e atrativos. Não há dúvida de que os incentivos fiscais são ferramentas importantes e, quando bem conduzidos, trazem resultados positivos para toda a sociedade. Mas é necessário que esta parceria entre poder público e iniciativa privada tenha a devida atenção e o efetivo aproveitamento social ou tecnológico.
Aline Corsetti Jubert Guimarães é advogada especialista em direito tributário do escritório Nogueira, Elias, Laskowski e Matias.
Fonte: Valor Econômico