Mais impostos que atrapalharão a economia
O governo empolga o país ao falar em simplificar tributos. Mas, às vezes, essa simplificação embute aumentos.
Trata-se da unificação das cobranças do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) , duas obrigações das empresas. O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) simulou como a mudança atingiria uma ampla gama de segmentos produtivos – empresas de recursos humanos, projetos de engenharia, contabilidade, cobrança, crédito, telecomunicações e outras. O estudo incluiu mais de 1.200 empresas e foi feito a pedido da Fenacon, uma organização representativa do setor de serviços. Caso seja adotada a mudança em estudo, essas empresas teriam de pagar por volta do dobro de PIS e Cofins – os aumentos na cobrança variam entre 80% e 137%, de acordo com o segmento. O impacto nos preços finais desses serviços ficaria entre 3,1% e 5,5%. Na média, 4,3% de encarecimento nos serviços prestados a cidadãos e a outras companhias.
As empresas de serviços teriam de escolher entre dois caminhos ruins: absorver esse custo (o que teria impacto direto em sua capacidade de investir, manter postos de trabalho, contratar e dar aumentos salariais) ou repassá-lo ao consumidor. Há que se considerar que o setor de serviços compreende 7 milhões dos cerca de 16 milhões de empresas existentes no país e responde por 40% dos empregos – 19,4 milhões dos 48,5 milhões de postos de trabalho existentes.
PIS e Cofins não são impostos, e sim “contribuições”. No idioma dos tributaristas, uma contribuição não tem nada de voluntária. Apenas, diferentemente dos impostos, o governo pode alterá-la mais facilmente, consegue recolhê-la mais rapidamente e deve destiná-la a um fim específico. As medidas em estudo, no caso dessas contribuições, incluem duas mudanças. A primeira é unificar a cobrança. Hoje, a maioria das empresas de serviços faz dois pagamentos distintos, que somam 3,65% sobre suas vendas. As duas contribuições seriam unificadas – o que, em tese, é uma boa mudança –, mas resultariam, juntas, num pagamento maior, de 9,25% sobre as vendas – o que seria uma mudança péssima (ainda que a mudança dê direito a alguns descontos, os créditos tributários).
A segunda novidade também prejudicaria muito os negócios de serviços. Atualmente, as empresas são divididas em duas categorias: as que pagam pelo regime cumulativo e as que pagam pelo regime não cumulativo. Este último é o usado pela indústria. Permite que cada empresa transforme em créditos tributários (desconto em tributos a pagar) as contribuições já pagas por seus fornecedores. Assim, o fabricante de plástico não repassa o custo tributário a seu cliente, o fabricante de autopeças. Que, por sua vez, não o repassa o custo tributário a seu cliente, o fabricante de automóveis. O sistema foi adotado em 2002, sob o discurso empolgante da simplificação tributária. Na mudança, porém, o governo já aproveitou para aumentar a carga das contribuições.
Para a indústria, vale a pena seguir esse sistema complicado. Ele reduz os preços finais dos produtos ao conter o pagamento em cascata de um tributo ruim. Afinal, a compra de insumos responde por grande parte dos custos do setor industrial, mais de 40%. Com a mudança, porém, todos os setores, incluindo comércio e serviços, passariam a trabalhar por esse sistema.
O problema é que os insumos, as mercadorias, correspondem a apenas 13% do custo final dos serviços. Gerariam poucos créditos tributários a abater. Proporcionalmente, as empresas do setor gastam muito menos com compra de material e muito mais com gente. A folha de pagamentos representa 55% de seus custos em comparação a 23% na indústria. E funcionários não são considerados um “insumo” capaz de gerar créditos com a Receita Federal. As autoridades econômicas devem tomar especial cuidado para não adotar, nas medidas tributárias, uma visão industrialista da economia, como se esse setor fosse mais virtuoso que os demais. O setor de serviços inclui segmentos com alto grau de inovação e com imenso potencial, como desenvolvimento de software, serviços ambientais, design, moda, turismo e gastronomia. Não podem ser sacrificados em nome da sanha arrecadatória. Simplificar o infernal sistema de impostos, taxas e contribuições no Brasil é uma frente de batalha nobre. Mas não vai muito longe se dificultar negócios e servir de cortina de fumaça para novos aumentos na tributação.