Importado garante alta de faturamento
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Por Tainara Machado e Carlos Giffoni | De São Paulo Apesar da estagnação da produção industrial em 2011, com crescimento de apenas 0,3% na comparação com 2010, o faturamento real das empresas industriais aumentou 5,1%, segundo dados divulgados ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). No mesmo período, o Índice de Preços ao Produtor foi de 2,61%. Nem todos os setores conseguiram repetir essa performance, mas uma parte relevante, especialmente aqueles em que a demanda se manteve mais aquecida, encontrou um ambiente em que foi possível repassar o aumento de preços e ainda aumentar as vendas, como é o caso de outros equipamentos de transporte, que inclui motocicletas, e do setor de couro e calçados, apesar da produção física muito mais morna.
No último ano, os artigos de couro e os calçados tiveram forte alta de 17,9%, segundo o IPP, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O aumento de custo, no entanto, não foi barreira para uma alta do faturamento real de 17,5%, segundo a CNI. Mas foram os produtos importados que tiraram proveito da demanda aquecida, já que a produção nacional recuou 10,4% em 2011, segundo o IBGE. “Nos segmentos em que a importação de produtos é relativamente fácil, é possível repassar preços mesmo com a produção reduzida”, segundo José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, para quem a perda de competitividade do setor tornará difícil uma recuperação mais forte em 2012.
.A mesma dinâmica se repete em outros produtos de transporte, que incluem motocicletas e aeronaves, por exemplo. Para Edgard Pereira, professor da Unicamp e sócio de uma consultoria que leva seu nome, a dinâmica entre aumento de preços de 6,8% e alta da produção de 8% em 2011, sempre na comparação com 2010, é indício de que uma boa parte do crescimento de 28,4% do faturamento se deu com vendas de produtos importados. “Se o custo de produção impõe que a alternativa para se manter no negócio é vender produtos industriais importados, o empresário faz o necessário para se manter na briga. E são setores em que foi possível repassar preços e aumentar o faturamento por causa da demanda ainda aquecida”, disse Pereira.
Do outro lado, o setor de vestuário e acessórios é um exemplo de quem não conseguiu acompanhar integralmente o aumento do preço ao produtor, mas essa é uma realidade dos últimos anos, segundo o presidente do Sindivestuário, Ronald Moris. “Desde que os produtos chineses começaram a entrar com força no nosso mercado, há pelo menos dois anos, essa dificuldade foi agravada.”
De acordo com o empresário, o setor de vestuário já encontrava dificuldades para repassar o preço dos insumos para o consumidor antes mesmo de as importações se tornarem o problema que são hoje. “O consumidor não conseguia pagar pela diferença de preço, por isso a indústria foi reduzindo a sua margem, mas o mínimo que conseguimos absorver ainda é caro, considerando a carga tributária brasileira, quando comparamos com o preço dos chineses”, afirma Moris.
Em 2011, o faturamento do setor cresceu 2,9%, segundo a CNI, apesar de a sua produção física ter recuado 4,4% no mesmo período – o que corrobora a tese de que os importados estão substituindo o produto nacional. Ao mesmo tempo, o IPP para o setor cresceu mais que o faturamento (4,9%), o que explica a perda de margem apontada por Moris.
Em novembro, o empresário esteve entre os industriais que participaram de reunião com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na qual foram prometidas medidas para aquecimento do setor têxtil e de vestuário. À época, Moris saiu otimista, mas mudou sua opinião. “Nada aconteceu desde então. O cenário daqui para frente é o pior possível.”
No setor têxtil a situação é mais difícil. A queda da produção foi de 14,9% na comparação com 2010 e o faturamento acompanhou esse cenário negativo, com recuo de 9,2% no ano passado, a maior queda entre todos os setores pesquisados pela CNI. A indústria têxtil sofre mais diretamente com a invasão de produtos finais, o que desestrutura a cadeia produtiva. “Como o vestuário está em processo de substituição de produção por importados, a indústria têxtil só diminui”, afirmou Edgard Pereira.
Segmentos em que a elasticidade da demanda ao repasse de preços é menor também sofreram, caso de derivados do petróleo e biocombustíveis, em que o faturamento real caiu 0,9%, mas os preços ao produtor subiram 4,7%, principalmente por causa da variação do álcool no último ano, segundo Pereira.
Para Gonçalves, do Banco Fator, o comportamentos dos setores industriais continuará a ser desuniforme, com pressões derivadas de aumentos de insumos e mão de obra em alguns segmentos. “Como o câmbio terá no máximo efeito neutro e continuará a não ajudar, quem enfrentou problemas em 2011 dificilmente verá situação muito mais confortável em 2012”, afirmou.
Indicador aponta produção quase estagnada em 2011
Os indicadores de atividade industrial fecharam 2011 “praticamente estáveis”, de acordo com pesquisa divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O uso da capacidade instalada caiu 0,1 ponto percentual, frente à média registrada em 2010. O número de horas trabalhadas avançou 0,9% em igual comparação. Como apontado ao longo do ano, o faturamento do setor se descolou da produção e obteve um aumento de 5,1% no ano, em relação ao mesmo período anterior.
Os ramos da indústria de transformação com maior queda na produção, medida pelas horas trabalhadas, foram vestuário, madeira, couros e calçados, máquinas e materiais elétricos. No sentido inverso, ficaram os setores de metalurgia, borracha e plástico, minerais não metálicos e equipamentos de transporte, exceto automotores, segundo o levantamento Indicadores Industriais.
“O desempenho da indústria beirou a estagnação, ficando muito aquém do resultado de 2010”, diz a CNI em relatório. Isso porque, em 2010, o faturamento real subiu 9,9% sobre 2009, e as horas trabalhadas cresceram 7,2%. O acúmulo de estoques ao longo do ano e a forte entrada de matéria-prima e produtos importados são as principais explicações, apontadas pela CNI, para a diferença entre nível de atividade e faturamento no ano passado.
Os segmentos de couros e calçados, material eletrônico e de comunicação e equipamentos de transporte, fora veículos automotores, registraram os maiores ganhos reais entre os setores da indústria de transformação pesquisados. Têxteis e madeira foram os ramos com maiores quedas no indicador.
A indústria teve, em dezembro passado, um recuo de 2,7% no faturamento real, em relação ao mês de novembro, segundo dados dessazonalizados. Mesmo com a tendência de queda do fim de 2011, a CNI acredita em recuperação da atividade ao longo deste ano.
“O desempenho da indústria em 2012 deve ser ligeiramente melhor do que em 2011”, avalia o gerente-executivo de políticas econômicas da instituição, Flavio Castelo Branco.
A previsão leva em consideração os efeitos de estímulos para alguns setores, como indústria automobilística e produtos domésticos, além da execução de ações do programa Brasil Maior. “Mas o problema maior, que é de competitividade e é provocado pela entrada de produtos manufaturados procedentes da Ásia, deve continuar”, afirma o economista.
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Fonte: Valor Econômico |